Na UFMG, o Ensino Remoto Emergencial (ERE), como um arremedo de educação à distância virtual, tem sido defendido pela reitoria e os órgãos colegiados como saída diante da situação da pandemia de coronavírus para a sequência ao ano letivo de 2020 dos seus cursos presenciais. E por mais que o reitorado insista em afirmar que o debate sobre o retorno às atividades vem sendo realizado de forma participativa e democrática, o que presenciamos, no conjunto das arenas administrativas, é a imposição do ensino e trabalho remotos a estudantes, técnicos administrativos em educação (TAEs) e docentes.

O que deve ser desvelado neste debate é a aceitação prévia do reitorado às recomendações que, com a intensificação da pandemia, foram dirigidas pelo MEC  (BRASIL, 2020) e, recentemente, pelo Conselho Nacional de Educação (CNE, 2020) sobre a reorganização do calendário escolar e do cômputo das atividades pedagógicas presenciais por não presenciais. Ou seja, o debate que se diz acontecer na UFMG, e as consultas dele decorrentes à comunidade interna, tem sido muito bem conduzidos pelo reitorado e, ao que parece, a partir de um direcionamento prévio e bem objetivo sob a insígnia “emergencial” na pandemia: da substituição de disciplinas presenciais por aulas não presenciais de forma permanente – o que indica provável avanço na regulamentação das atividades complementares, das avaliações, dos trabalhos de conclusão de cursos e das aulas de laboratório, não excluídas as atividades de extensão universitária e os estágios, para as modalidades virtuais. Qualificar as atividades administrativas e acadêmicas virtuais para além do tempo da pandemia se apresenta, portanto como um objetivo real do reitorado, o que justifica seu movimento atual de preparar novas normas internas para a implementação do teletrabalho para docentes e TAEs e proceder o atendimento ao público também remotamente. Elementos, portanto centrais que manifestam a flexibilização do trabalho e da educação no curso da implantação do que interessa ao reitorado do projeto Future-se na Universidade (UFMG, 2019). 

As ações já adotadas e em execução para o que a Reitoria tem alardeado como novo normal na UFMG são incompatíveis com as demandas particulares de grande parte da comunidade universitária (UFMG, 2020a). Além disso, uma vez que também buscam monetizar as políticas de assistência estudantil e de inclusão digital da UFMG, elas deslocam a responsabilidade da condução do ERE para os estudantes, docentes e TAEs, com claras intenções de minimizar as responsabilidades da instituição sobre as prováveis lacunas da formação e da grande evasão estudantil esperada dos cursos. Os dados apresentados pela Reitoria demonstram que, aproximadamente, nove mil estudantes (30%) tendem a ter sérias dificuldades para a condução dos seus processos formativos (UFMG, 2020b), seja por incompatibilidades digitais, seja por situações e ou condições sociais não sanáveis pela política de assistência estudantil local ou por qualquer outra política social conduzida pelo estado burguês. Tudo indica que os dados consultados referentes aos docentes e TAEs não serão divulgados a fundo pela universidade, uma vez que manifestarão novas e velhas questões do mundo do trabalho – como sobre as responsabilidades de aquisição e manutenção dos meios e instrumentos para o trabalho remoto, regulamentação das jornada de trabalho, sobre a segurança digital, entre outros – que inviabilizariam o sorrateiro projeto de educação remota precarizada que será assumida pela UFMG sob a carta branca do sindicalismo de resultados protagonizados pelo SINDIFES e pela APUBH. Estes sindicatos além de terem orientado o trabalho remoto sem exigências para a sua regulamentação na universidade (APUBH, 2020; MATIAS, 2020), acenaram disposição para a conciliarem com o reitorado a precarização da educação em curso na UFMG também sob o ilusório mote: os estudantes não ficarão para trás ou serão prejudicados.

A avaliação do Movimento Universidade Popular (MUP) é que a categoria discente já está para trás há muito tempo! E ficará ainda mais diante de um ERE que ignora as novas situações vividas pelos estudantes na pandemia. As situações compartilhadas são muitas. O isolamento social tem exigido novos comportamentos e atribuições. É de se fazer assumir, neste debate, que muitos dividem moradias e estão lidando diretamente no cuidado pessoal e de familiares que contraíram o novo coronavírus. Reconhecemos também um número significativo de mães estudantes que, neste momento, por não possuírem acesso à creches ou a escolas para seus filhos e filhas, assumiram o cuidado integral das crianças, somado ao acompanhamento das aulas, também remotas e já reconhecidas como incipientes, oferecidas pelas escolas primárias.

Jovens trabalhadores e trabalhadoras estudantes também existem na UFMG. E não bastassem as duras e precarizadas condições de trabalho, emprego e moradia, ainda serão necessárias novas organizações para assumirem o ERE onde e do jeito que conseguirem. Certo será que o percurso do ERE não deixará de provocar os agravos à saúde, com a diferença de que caberá a cada um e cada uma buscar assistência dentro das suas possibilidades e disponibilidades. Para a UFMG, ao que parece, estará tudo bem se esses estudantes ficarem para trás! Afinal, novas medidas de flexibilização das normas acadêmicas para trancamentos já foram anunciadas. Quanto aos docentes e TAEs que vivem situações similares, nada tem se discutido ou proposto em âmbitos gerais, inclusive nas suas respectivas arenas sindicais. 

A situação de contágio do novo coronavírus exige a paralisação das atividades presenciais de ensino sem prejuízos nos percursos curriculares formais. Melhor seria se os colegiados dos cursos tivessem trabalhado com seu corpo docente e TAEs novas ofertas pedagógicas a partir das condições e necessidades dos seus estudantes. A retomada do ano letivo de 2020 deveria ter sido assumida pela diretriz da complementaridade da formação curricular (por meio de pesquisa e extensão, de estudos dirigidos, entre outros) e não pela suplementação das atividades presenciais de ensino por ERE ou qualquer outra modalidade de  tecnologia virtual e digital.

A comunidade da UFMG precisa debater o ERE considerando o processo recente de sucateamento e de precarização do ensino superior em curso, da sua relação com o atualizado projeto Future-se (BEZERRA, 2020), bem como com as inúmeras e recentes medidas adotadas pelo reitorado que, sob um discurso mascarado pela democracia liberal, tem contribuído, e muito, para a implementação de um modelo empresarial de educação na UFMG. 

Contra o Ensino Remoto Emergencial e o Ensino à Distância!

Que nenhum estudante realmente fique para trás!

Por uma universidade construída com base nas necessidades e capacidades da juventude e classe trabalhadora!

Lutar, criar Universidade Popular!

 

Referências

APUBH. Nota da Diretoria do APUBH: Resoluções da Assembleia de 15 de maio. Disponível em: https://apubh.org.br/acontece/nota-da-diretoria-do-apubh-resolucoes-da-assembleia-de-15-de-maio/

UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS. Ações emergenciais e em execução. Apresentação. 2020a. 10p. Disponível em: http://www.ppgcom.fafich.ufmg.br/noticias/Apresentacao_Conselho_acoes_emergenciais.pdf

UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS. Consulta a estudantes da UFMG: relatório síntese – questões objetivas graduação. Apresentação. 2020b. 16p. Disponível em: https://www.ufmg.br/prae/wp-content/uploads/2020/06/Consulta_Estudantes_Relatorio_Sintese_Graduacao.pdf

BEZERRA, Fábio. Future-se 2.0: os retrocessos na Educação. 2020. Disponível em: https://pcb.org.br/portal2/25709/future-se-2-0-os-retrocessos-na-educacao/

BRASIL. Portaria Nº 544, de 16 de junho de 2020. Dispõe sobre a substituição das aulas presenciais por aulas em meios digitais, enquanto durar a situação de pandemia do novo coronavírus – Covid-19, e revoga as Portarias MEC nº 343, de 17 de março de 2020, nº 345, de 19 de março de 2020, e nº 473, de 12 de maio de 2020. DOU, 17 jun 2020, edição 114, seção: 1, p.62. Disponível em: http://www.in.gov.br/en/web/dou/-/portaria-n-544-de-16-de-junho-de-2020-261924872

CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO. Parecer   CNE/CP   nº   9/2020. Reexame do Parecer CNE/CP nº 5/2020, que tratou da reorganização do Calendário Escolar e da possibilidade de cômputo de atividades não presenciais para fins de cumprimento da carga horária mínima anual, em razão da Pandemia da COVID-19. 2020. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_docman&view=download&alias=147041-pcp009-20&category_slug=junho-2020-pdf&Itemid=30192

MATIAS, Vinícius. UFMG, CEFET-MG e IFMG suspendem as atividades presenciais e orientam trabalho remoto em razão das medidas de prevenção a pandemia do coronavírus. 2020. Disponível em:

https://sindifes.org.br/ufmg-cefet-mg-e-ifmg-suspendem-as-atividades-presenciais-e-orientam-trabalho-remoto-em-razao-das-medidas-de-prevencao-a-pandemia-do-coronavirus/

UFMG. Gabinete da Reitora. Nota a comunidade acadêmica. 2019. Disponível em: https://ufmg.br/storage/a/0/2/e/a02e5c5b5111f1604962df9e8ad1bdb2_15653964496614_1794882514.pdf