{"id":74676,"date":"2020-06-16T17:20:59","date_gmt":"2020-06-16T17:20:59","guid":{"rendered":"https:\/\/www.poderpopularmg.org\/?p=74676"},"modified":"2020-06-16T17:20:59","modified_gmt":"2020-06-16T17:20:59","slug":"o-antifascismo-tem-eclipsado-a-luta-antirracista","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/www.poderpopularmg.org\/o-antifascismo-tem-eclipsado-a-luta-antirracista\/","title":{"rendered":"O antifascismo tem eclipsado a luta antirracista ?"},"content":{"rendered":"

Nas \u00faltimas semanas evidenciamos manifesta\u00e7\u00f5es populares e massivas ao redor do mundo e no Brasil, iniciadas nos Estados Unidos, a partir do assassinato de George Floyd, um homem negro estadunidense, que foi estrangulado em publico por um policial, na cidade de Minneapolis.<\/p>\n

No Brasil, frente \u00e0 politica de assassinato enfrentada pela popula\u00e7\u00e3o negra nas periferias brasileiras pelas m\u00e3os de agentes do estado, conjuntamente com a conjuntura pand\u00eamica que enfrentamos sob o governo de Bolsonaro, as mobiliza\u00e7\u00f5es tomaram um car\u00e1ter e uma identidade visual antifascista e com isso uma pol\u00eamica tem tomado protagonismo em discuss\u00f5es nas redes sociais: A luta antifascista apaga ou relega a luta antirracista a um segundo plano?<\/p>\n

Esse questionamento que tem acalorado os debates durante as \u00faltimas semanas, tem que ser levado muito a s\u00e9rio, tanto para compreendermos o que aflige, dignamente, v\u00e1rios de nossos companheiros do Movimento Negro. Quanto para resgatarmos historicamente o que foi a A\u00e7\u00e3o Antifascista, o que \u00e9 o fascismo e sua forma brasileira.<\/p>\n

Comecemos buscando a origem do Movimento Antifascista: Fundado pelo KPD (Partido Comunista Alem\u00e3o) juntamente com agrupamentos Anarquistas, em meados de 1932, a Antifaschistische Aktion (A\u00e7\u00e3o Antifascista), foi uma frente de combate ao crescente numero de agrupamentos paramilitares fascistas que a durante a Rep\u00fablica de Weimar a Alemanha se deparava. Essa frente, portanto, al\u00e9m de combater tais grupos tinha um forte car\u00e1ter Anticapitalista e revolucion\u00e1rio.\u00a0<\/span><\/p>\n

Como j\u00e1 foi discutido e esmiu\u00e7ado por diversos autores como Franz Fanon, Angela Davies, Florestan Fernandes entre muitos outros. Na forma\u00e7\u00e3o e manuten\u00e7\u00e3o do capitalismo, tra\u00e7o muito marcante no Brasil, o racismo teve o papel de justificar a expans\u00e3o colonial e o processo de acumula\u00e7\u00e3o primitiva dos estados europeus, e tornou-se estrutural na explora\u00e7\u00e3o de classe e na manuten\u00e7\u00e3o do status quo. \u00c9 elemento da g\u00eanese e o sangue desse organismo, algo vital que permite e justifica a coloniza\u00e7\u00e3o, a desigualdade gritante e exacerbada dos centros capitalistas e suas periferias, a superexplora\u00e7\u00e3o e outras contradi\u00e7\u00f5es da qual a popula\u00e7\u00e3o brasileira e outras n\u00e3o brancas ao redor do mundo sofrem.\u00a0<\/span><\/p>\n

Para o Leandro Konder, fil\u00f3sofo Brasileiro, o fascismo n\u00e3o \u00e9 apenas uma ideologia da direita que utiliza a viol\u00eancia, persegui\u00e7\u00e3o e assassinato de opositores para conserva\u00e7\u00e3o do status quo capitalista (por mais extrema e escarnecedora que essa viol\u00eancia possa ser). Em suas palavras observando seus expoentes europeus do g\u00eanero, “O fascismo representou, na hist\u00f3ria contempor\u00e2nea da direita, uma energ\u00e9tica tentativa no sentido de superar a situa\u00e7\u00e3o altamente insatisfat\u00f3ria que a contradi\u00e7\u00e3o de que v\u00ednhamos falando tinha criado para as for\u00e7as conservadoras mais resolutas. Enfrentando os problemas das tens\u00f5es que se haviam criado no \u00e2mbito da direita entre a teoria e a pr\u00e1tica, o fascismo adotou a solu\u00e7\u00e3o do pragmatismo radical, servindo-se de uma teoria que legitimava a emascula\u00e7\u00e3o da teoria em geral.\u201d [1].<\/p>\n

Partindo disso e tendo em vista \u00e0s peculiaridades da forma\u00e7\u00e3o capitalista dependente brasileira, esse pragmatismo radical do qual as for\u00e7as fascista se utilizam, se firmam sobre um car\u00e1ter j\u00e1 latente na sociedade, o racismo. N\u00e3o representando apenas uma extens\u00e3o dos mecanismos e tecnologias de opress\u00e3o e persegui\u00e7\u00e3o estatal, que antes estavam restritos aos corpos negros, \u00e0 popula\u00e7\u00e3o e aos agentes pol\u00edticos brancos, e n\u00e3o negros. Estende essa viol\u00eancia a esses grupos outrora protegidos pelo status quo racial, mas principalmente refor\u00e7a, justifica e aumenta o terrorismo de estado a negras e negros.<\/p>\n

Apesar da polemica se o regime burgo-militar (1964 \u2013 1985) foi um regime fascista ou n\u00e3o, os aparatos repressivos estruturados durante esse per\u00edodo nos apresentam um exemplo hist\u00f3rico. Na memoria coletiva desse l\u00fagubre episodio da nossa historia, ficaram marcadas as grandes persegui\u00e7\u00f5es que ocorreram a agentes pol\u00edticos e partidos de esquerda, porem rotineiramente se esquecem dos famosos grupos de exterm\u00ednio como os 12 homens de ouro, Scuderie Detetive Le Cocq entre outros que surgiram pelo Brasil no per\u00edodo. Que tinham uma dupla fun\u00e7\u00e3o, perseguir e assassinar inimigos do regime, e \u201ccontrolar a criminalidade\u201d nos grandes centros urbanos, \u201ccontrole\u201d esse feito com base em uma politica de exterm\u00ednio contra popula\u00e7\u00e3o pobre e perif\u00e9rica, portanto negra. Formados em sua maioria por policiais civis e militares muitas vezes validados e financiados abertamente por agentes do estado brasileiro.<\/p>\n

Tal pratica n\u00e3o cessou, mesmo ap\u00f3s o fim do regime. Mas se mantinha na margem da criminalidade, porem juntamente com a ascens\u00e3o do fascista Jair Bolsonaro grupos de milicianos, an\u00e1logos aos grupos de exterm\u00ednios, at\u00e9 mais estruturados, voltaram a emergir para superf\u00edcie, a j\u00e1 n\u00e3o se estranha quando vemos Bolsonaro e seus lacaios defenderem a legaliza\u00e7\u00e3o de tais grupos, que j\u00e1 constituem um importante bra\u00e7o armado do mesmo.\u00a0<\/span><\/p>\n

No Rio de Janeiro, onde h\u00e1 anos a popula\u00e7\u00e3o perif\u00e9rica \u00e9 assolada por uma serie de politicas de estado assassinas, que n\u00e3o cessaram nem sob os governos de tra\u00e7os mais \u201cprogressistas\u201d . O outro grande expoente do fascismo tropical, Wilson Witzel, que se elegeu com base em slogans como \u201cNo meu governo a Policia vai mirar na cabecinha e…fogo\u201d, encerrou seu primeiro ano como governador do estado com recordes hist\u00f3ricos nas mortes efetuadas pela policia. Mortes essas como das crian\u00e7as negras, \u00c1gatha Felix e Jo\u00e3o Pedro, respectivamente com 8 e 14 anos de idade, entre muitos outros casos.<\/p>\n

Logo a exposi\u00e7\u00e3o de tais fatos tem como fun\u00e7\u00e3o procurar demonstrar que a luta antifascista no Brasil n\u00e3o pode existir sem o antirracismo, e que ambas devem estar atravessadas por um profundo senso anticapitalista. Devemos rejeitar qualquer vis\u00e3o antifascista de mercado, que reduza tal movimento hist\u00f3rico a simples est\u00e9tica vend\u00e1vel de revolta.<\/p>\n

Pois se no fascismo, fase superior do capitalismo, esse sistema frente a sua fal\u00eancia completa, responde ao povo, sobretudo ao povo preto, com a morte e a persegui\u00e7\u00e3o em n\u00edveis estratosf\u00e9ricos, a experi\u00eancia hist\u00f3rica nos mostra que a Democracia Burguesa n\u00e3o \u00e9 capaz de abarcar e dissolver tais contradi\u00e7\u00f5es, quando muito as atenua, at\u00e9 que as serpentes voltem a eclodir dos ovos.<\/p>\n

S\u00f3 compreendendo profundamente o papel do racismo na forma\u00e7\u00e3o e perpetua\u00e7\u00e3o do capital, fugindo da ilus\u00e3o de volta a um passado id\u00edlico de democracia liberal burguesa, pode-se pensar em uma t\u00e1tica que nos tire dessa encruzilhada, nos coloque no rumo do socialismo, no rumo da liberta\u00e7\u00e3o humana.<\/p>\n

[1] Leandro Konder, Introdu\u00e7\u00e3o ao fascismo, pg.29\u00a0<\/span><\/p>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":"

ARTUR NICOLAU<\/p>\n","protected":false},"author":3,"featured_media":74677,"comment_status":"open","ping_status":"open","sticky":false,"template":"","format":"standard","meta":{"footnotes":""},"categories":[172,180],"tags":[],"_links":{"self":[{"href":"https:\/\/www.poderpopularmg.org\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/74676"}],"collection":[{"href":"https:\/\/www.poderpopularmg.org\/wp-json\/wp\/v2\/posts"}],"about":[{"href":"https:\/\/www.poderpopularmg.org\/wp-json\/wp\/v2\/types\/post"}],"author":[{"embeddable":true,"href":"https:\/\/www.poderpopularmg.org\/wp-json\/wp\/v2\/users\/3"}],"replies":[{"embeddable":true,"href":"https:\/\/www.poderpopularmg.org\/wp-json\/wp\/v2\/comments?post=74676"}],"version-history":[{"count":1,"href":"https:\/\/www.poderpopularmg.org\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/74676\/revisions"}],"predecessor-version":[{"id":74681,"href":"https:\/\/www.poderpopularmg.org\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/74676\/revisions\/74681"}],"wp:featuredmedia":[{"embeddable":true,"href":"https:\/\/www.poderpopularmg.org\/wp-json\/wp\/v2\/media\/74677"}],"wp:attachment":[{"href":"https:\/\/www.poderpopularmg.org\/wp-json\/wp\/v2\/media?parent=74676"}],"wp:term":[{"taxonomy":"category","embeddable":true,"href":"https:\/\/www.poderpopularmg.org\/wp-json\/wp\/v2\/categories?post=74676"},{"taxonomy":"post_tag","embeddable":true,"href":"https:\/\/www.poderpopularmg.org\/wp-json\/wp\/v2\/tags?post=74676"}],"curies":[{"name":"wp","href":"https:\/\/api.w.org\/{rel}","templated":true}]}}